Uma Noite de 12 Anos é uma co-produção de três países: Uruguai, Argentina e Espanha. O foco aqui é a prisão de três homens uruguaios: Eleuterio Fernández Huidobro, Mauricio Rosencof e José Alberto Mujica Cordano (sim, o ex-Presidente). O trio ficou preso por mais de 10 anos (o 12 no título quer dizer algo…) na época da ditadura no país e o longa mostra como eles lidaram com essa situação.
“Seria mais humano se o fuzilasse”, esta frase, dita por um militar para um dos personagens marca bem o que aquelas (e outras tantas) figuras passaram. Todo tipo de degradação humana é vista. Mas mais do que a tortura pela tortura – leia-se: militares urinando, comida sendo extremamente racionada, além de outros descasos com a higiene e saúde dos presos – o filme mostra bem os reflexos psicológicos.
Não raro os personagens em um misto de alucinação e lembrança nos evidenciam uma camada além. E isso é usado com parcimônia por Uma Noite de 12 Anos. Aliás, ele é repetitivo, mas a redundância faz sentido para nos mostrar um pouco da rotina. Então incontáveis vezes temos os protagonistas encapuzados sendo transportados, por exemplo.
O outro lado também é mostrado com algumas nuances. Claro que o filme tem um viés, mas ainda assim temos alguns militares que são mais humanizados, outros são pintados só como escrotos mesmo. O destaque vai para uma relação, digamos, “literária”.
Não à toa a frase que abre o longa é: “Qual é a minha sentença?”/ “Você irá senti-la na pele!”. Há um grande trabalho imersivo. Além da direção de Álvaro Brechner, o mérito cai na conta de outros três quesitos: a fotografia que sabe equilibrar a escuridão inerente ao local sem nunca deixar o público na penumbra e a direção de arte que trouxe um trabalho tão rico que quase sentimos o cheiro, nada agradável, das prisões. A sensação claustrofóbica é grande.
O terceiro fator merece um destaque à parte: o trio de atores (Alfonso Tort, Chino Darín e Antonio de la Torre). A degradação física e mental é nítida e as emoções são sinceras. Não imagino o quão desgastante deve ter sido o trabalho de preparo e entrega física desses três. Sentimos verdade nas pequenas vitórias, nos momentos que eles têm ideias e, claro, nas dores de sofrer o cárcere por tantos dias.
Curioso que mesmo com um tema pesado, há bons momentos de alívio cômico. Nesse sentido Uma Noite de 12 Anos lembra o documentário Torre das Donzelas, que cobrimos agora no Festival de Brasília. No entanto, aqui esses momentos acabam se alongando, vide a cena em que diversas patentes são acionadas para resolver um problema estomacal.
Outro problema do filme são os letreiros iniciais e finais. Especialmente em filmes históricos os diretores na ânsia de contextualizar acabam subestimando a inteligência do público e até a qualidade do próprio filme de conta a história ao usar frases explicativas. As do começo antecedem o que vai acontecer nas próximas duas horas e as do final retratam o que acabou de passar na cena. A insistente marcação temporal também é uma falha já que fica evidente o avançar da data dentro do filme.
No saldo geral, todavia, o saldo de Uma Noite de 12 Anos é muito positivo. O peso da dor dos envolvidos é retratado de forma espetacular. E como isso é o mote principal aqui, há sem dúvidas um sucesso na proposta.
1973, Uruguai. José Mujica (Antonio de la Torre), Mauricio Rosencof (Chino Darín) e Eleuterio Fernández Huidobro (Alfonso Tort) são militantes dos Tupamaros, grupo que luta contra a ditadura militar local. Eles são presos em ações distintas e encarcerados junto a outros nove companheiros, de forma que não possam sequer falar um com o outro. Ao longo dos anos, o trio busca meios de sobreviver não só à tortura, mas também ao encarceramento que fez com que ficassem completamente alheios à sociedade, sem a menor ideia se um dia seriam soltos.